abril 06, 2015

A eterna problemática capilar

Tyra Banks
É bem verdade que a questão da aparência dos cabelos não se restringe à raça, credo ou gênero, mas eu garanto que quando falamos de um grupo problemático nesse quesito vale citar as mulheres negras, como eu. Não só passei a vida tentando modificar meu cabelo para ter a aceitação social e pessoal (sim, eu me perguntava o que estava errado comigo), como também sofria por nunca ter cabelos longos. Eu sempre detestei ter cabelos curtos e jamais consegui mantê-los bonitos e saudáveis para que chegassem a ser compridos. 

Hoje em dia, em meio a um grande movimento de aceitação de nossas raízes, vejo muitas mulheres negras buscando seus cabelos naturais, perdidos no tempo e entre alisamentos. Cabelos que a maioria nem sabe ou lembra como eram originalmente. Eu me enquadrava nesse perfil, parei de processar meus cabelos quimicamente, comecei a deixá-los crescer para conhecê-los melhor. O cabelo que foi nascendo é muito mais forte, brilhoso e bonito. Fui cortando as partes relaxadas para diminuir a aberração que é ter dois tipos de cabelo ao mesmo tempo. 

Entretanto, tudo caiu por terra quando - já de cabelo super curto - descobri que teria que cortar bastante mesmo para ter um cabelo mais apresentável e todo natural. Não me leve a mal, o meu cabelo sem química, que deixei crescer por meses e meses, é lindo de verdade, mas não consegui me comprometer com duas texturas ao mesmo tempo e muito menos cortar o cabelo mais curto do que está agora e relaxei tudo de novo.  
Admito que gosto do cabelo alisado porque me dá muito menos trabalho no dia-a-dia do que quando era enrolado, embora custe pouco para ficar feio e sem vida e começar a quebrar. Eu não compartilho da opinião de algumas pessoas que acham que porque sou negra TENHO que usar meu cabelo natural. Para mim esse tipo de atitude é igualzinha a dizer que tenho que usar alisante para parecer mais bonita. Por ser um ser humano, eu usarei meu cabelo como eu achar que mais me convém e me alegra o fato de saber que sempre posso modificar tudo ou raspar e começar do zero.


Vivendo na terra do tio Sam e observando a comunidade negra aqui, é notório que pelo menos 80% das mulheres usa perucas e apliques e seus cabelos parecem cabelos de estrelas de Hollywood. Ao chegar aqui, me deixei seduzir pelos apliques que gostei de usar em ocasiões especiais. Mais recentemente, me rendi e comprei uma peruca. O plano era praticamente raspar o meu cabelo e deixar crescer no natural protegidinho embaixo de uma peruca cheia de glamour. Perfeito, né? Seria, se eu não me sentisse absolutamente ridícula, paranoica e desconfortável toda vez que a estou usando. A coisa mais estranha é que todo mundo elogia dizendo que fiquei ótima (não vamos nem analisar o porquê), mas eu me sinto um ET, cismada que as pessoas estão olhando e rindo de mim - internamente. Muitas vezes me obrigo a usar, já que foi uma fortuna, mas a melhor parte do dia para mim é quando entro em casa e tiro a peruca.

Só falta um mega hair agora...

fevereiro 18, 2015

Sexta-feira 13


Não bastava o fato de eu, garota da cidade convicta e moradora de apartamentos a vida toda, morrer de medo de morar numa casa num lugar calmo até demais, a ida do meu marido à Suécia a trabalho tinha que acontecer. Nos dias que precederam a viagem até achei que eu tiraria de letra já que ele aceitou instalar um sistema de segurança para que eu pudesse ficar mais tranquila.
Só que essa tão esperada tranquilidade não veio. Cada noite era um pouco mais escura e aterrorizante do que a noite anterior, até que chegou a madrugada de sexta-feira.

Eu estava dormindo profundamente quando meu marido me ligou da Suécia (pela quinta vez) e me acordou. O tom de sua voz era inquieto e demorei a achar o sentido do que ele dizia. Finalmente consegui entender que ele estava me perguntando se a empresa de segurança não tinha me ligado. Quando respondi que não, ele prosseguiu me informando que o sensor de movimento dentro de casa tinha disparado. 

Foi igual tomar um banho de água gelada! Despertei na hora diante da possibilidade de ter um intruso dentro de casa quando eu estava sozinha e cercada no segundo andar. Com o coração na boca, não conseguia mais acompanhar o que meu marido dizia em uma tentativa inútil de me manter calma. Meu pavor cresceu quando percebi que nosso cachorro estava de pé e alerta no canto do quarto, praticamente vi a minha vida passar em frente aos meus olhos.

Subitamente ouvi a campainha e o cachorro pôs-se a latir, meu marido dizia do outro lado da linha: “É a polícia! Vá abrir a porta!" e eu teimava que não queria descer as escadas e ser surpreendida pelo criminoso/serial killer/estuprador que estava lá embaixo. Dei-me por vencida quando meu marido me avisou que se eu não abrisse a porta, eles arrombariam.

Desci as escadas de camisola, descabelada e petrificada. Abri a porta e dei de cara com uma policial, parecendo aquela típica cena de filme: uniforme marrom, super séria perguntando se eu estava sozinha. Fiz que sim com a cabeça e ela entrou, com uma lanterna e uma arma e começou a checar a casa. Eu ia atrás, trêmula e o cachorro latia no segundo andar.

A policial comentou que ele latiria se houvesse alguém em casa e que ela tinha checado o perímetro e não tinha visto nenhuma pegada ao redor da casa (sim, pegadas na neve são fáceis de identificar). Ainda assim, na minha cabecinha medrosa, eu achava possível que alguém pudesse ter entrado em minha casa (ETs ou tele transporte, vai saber...), pedi que ela checasse o tão temível porão e ela atendeu prontamente: Nada. Tudo trancado e nenhum indício da presença de ninguém.

Foi então que ela, a salvadora da pátria, descobriu que a persiana em uma das janelas da cozinha tinha caído e acionou o sensor. Acho que mereci, pois quem manda comprar as persianas mais vagabundas que consegui encontrar? Me despedi dela lembrando que eu tinha pensado na noite anterior que algo aconteceria na sexta-feira 13. Eu estava certa, só que não encontrei nenhum Jason Vorhees, só Murphy e sua lei.

Blogueira do século passado com orgulho

Eu não tenho dúvidas que o conceito de blog mudou radicalmente desde que comecei a me autodenominar 'blogueira' há alguns anos. Tenho certeza também que os blogs de hoje em dia são bem mais úteis já que trazem informações, artigos de formadores de opinião, prêmios, etc. Os blogueiros de hoje em dia são praticamente pequenos empresários. Confesso que os admiro demais, mas eu sou uma blogueira à moda antiga. Deixei-me contaminar por certo cinismo ao notar que eu estava completamente démodé e obsoleta no mundo virtual das palavras. Comecei a escrever de forma contida e envergonhada, com medo de me expor demais, segurando sentimentos com toda força para que eles não pudessem transbordar e invadir minha prosa. 

Só me faltou mesmo perceber que sem eles, os sentimentos e a exposição, eu não tinha nada - nem prosa e nem verso.


Voltemos à antiga programação.

janeiro 26, 2015

Pelo direito de parir ou não.

Quando eu era mais nova, sempre achei que um dia eu  ia querer ser mãe. Fazia pleno sentido já que sempre gostei de crianças e me considerava ótima para lidar com elas. O único detalhe é que essa vontade nunca veio, penso que o tal relógio biológico pode estar quebrado ou sem bateria. Veja bem, eu não afirmo que jamais vou querer vivenciar a maternidade, mas eu devo admitir que só de pensar a respeito já me corre um calafrio de terror espinha abaixo. 

Estando casada há quase dois anos e tendo a minha idade, as pessoas já começaram a interferir na minha escolha, - nada de novo aí, eu sei - mas o meu problema reside no fato de morar numa cidade considerada pequena e num país diferente daquele onde nasci. Me assombra como um lugar que praticamente governa o mundo em termos de avanços tecnológicos, científicos e até sociais pode ser onde estão as pessoas mais conservadoras e de mentalidade mais tacanha que já vi. Eu bem sei que toda vez que alguém se casa, as cobranças alheias começam, especialmente vindo dos mais velhos. Todavia, o que vivencio aqui é um pouco mais profundo.

Não existe um dia que eu não ouça uma indireta de alguém acerca do pouco tempo que tenho para engravidar. Que coisa mais cansativa! Olhares de reprovação de uma pessoa mais jovem do que eu porque eu disse que não queria ser mãe. Muitas vezes as pessoas estão felizes em me conhecer, fascinadas com a minha nacionalidade e tudo isso cai por terra se por ventura tocarmos nesse assunto. É como se eu fosse uma pessoa má por não querer ter filhos, incompetente por não estar preparada para ser mãe, preguiçosa, egoísta e mais um monte de adjetivos não muito legais. Me causa muito estranhamento ouvir no século XXI que o único motivo para duas pessoas estarem juntas é ter filhos ou que meu marido, que nem sabe se quer filhos, vai me culpar de tê-lo privado de ser pai no futuro e me deixar por alguém mais nova que possa realizar o desejo dele, ou ainda, que eu nunca serei completa por nunca ter parido ninguém ou não terei alguém para cuidar de mim quando for velha (e a egoísta sou eu).


Pensando com meus botões e me conhecendo bem, acho que essa pressão exterior me faz ser mais aversa ainda à ideia de ter filhos, cada dia um pouco mais. Onde está o meu direito de escolher o que quero para mim? É muito fácil julgar quando não a pessoa não vai vir até aqui trocar fraldas sujas, amamentar, ficar sem dormir e pagar pelo custo de ter um filho por mim. Já ouvi piadinhas também por ter um cachorro. Alguns acham absurdo que alguém possa ter afeição por um animal, mas não queria crianças.  Sim, porque as pessoas acreditam mesmo que não são ignorantes ao tentarem forçar suas escolhas, preferências e opiniões na vida de outrem. O meu enjoo ultimamente é tanto que até passei a gostar menos de crianças do que eu gostava antes.

Pode ser que eu um dia mude de ideia, pode ser que engravide de forma indesejada, mas existe a possibilidade que eu nunca seja mãe e seja muito mais feliz por isso. Só gostaria mesmo de exercer o meu direito de decidir o que é melhor pra mim sem ter nenhuma patrulha  - preconceituosa - da moral e da normalidade me dizendo o que devo fazer com minha vida. E já que estou no assunto, o mesmo serve para a escolha do parto, caso um dia eu  tenha um.

Fica meu apelo: parem de parir pela vagina alheia!